Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

barulho de fundo

quem tem alma não tem calma.

barulho de fundo

quem tem alma não tem calma.

10.09.25

Gastar dinheiro,

de forma intencional.

Fala-se de poupança como quem fala de higiene. É um dever básico. Fala-se de investimento como se fosse a versão adulta da ambição. Quem sabe investir está a construir o futuro. Mas raramente falamos de gastar dinheiro de forma intencional. Sem culpa. Sem desperdício. Gastar parece sempre associado à leviandade. Ao impulso. À falta de disciplina. Como um erro a justificar.   Só que gastar é inevitável. Um acto que molda tanto a nossa vida quanto poupar ou investir. O que (...)
09.09.25

O direito interdito de ser apenas mulher

  Não sou feminista. Não me identifico com as barricadas, nem com os megafones, nem com a exigência de que homens e mulheres sejam iguais em tudo. Não acredito em simetrias forçadas. Somos diferentes. E há uma nobreza intrínseca nessa diferença. Há coisas que são de homens. Há coisas que são de mulheres. E essa divisão natural é uma arquitectura tão antiga quanto a própria humanidade. A diferença não nos diminui. Completa-nos.   Mas o que dizer quando essa diferença (...)
08.09.25

Os do bairro e os bairristas

 Há bairros construídos em cimento e outros em pertença. O primeiro levanta-se com gruas, o segundo ergue-se em vizinhos que sabem onde estava a bicicleta encostada vinte anos antes. É aqui que surgem os do bairro e os bairristas. Duas espécies que se confundem na geografia. Não no sangue.   Os bairristassão os guardiões da memória. Não precisam de mapas nem de fotografias antigas. Carregam o bairro nos gestos. Sabem onde a calçada se solta primeiro depois das chuvas. Onde (...)
07.09.25

Quem nos salva é a natureza

  Há sempre um momento em que a natureza nos apanha distraídos. Pode ser no instante em que o sol se põe. Ou naquela noite em que prometemos regressar cedo e acabamos a inventar desculpas para prolongar a estadia na areia fria da praia. A natureza tem essa habilidade. Roubar-nos o relógio e devolver-nos a vida.   O mar. Não importa quantas tarefas acumulamos. Quantas notificações esperneiam no bolso. Quantas vezes repetimos que amanhã vai ser um dia puxado. Basta entrar. Basta (...)
01.09.25

Conversas à beira-mar

Há um tipo de conversa que só acontece à beira-mar. Com a água a bater no tornozelo. O peso que passa de um pé para o outro. A sensação da água fria, que sobe e desce. O gesto de enterrar os calcanhares na areia até formar um buraco. A coreografia sem intenção. Enquanto falamos, vamos construindo o que a próxima onda vai desfazer.   O curioso é que este vaivém do mar dita também o ritmo do discurso. As pausas coincidem com o rebentar da espuma. As frases ficam suspensas (...)
12.08.25

Férias,

o corpo demora a perceber que já não está de serviço,

O calendário diz que as férias começaram. Mas o corpo não ouve. Vive de hábitos. E os hábitos não se mudam com o check-out mental.   O primeiro dia de férias é um território estranho. O despertador que não toca, mas acordamos cedo demais. Não por vontade, mas por reflexo. Os músculos ainda carregam a tensão de semanas. Meses de rotina. Os ombros continuam altos. As mãos movem-se rápido para preparar o pequeno-almoço. O corpo age em piloto automático, programado para (...)
09.08.25

Graffitis -

às vezes falam, às vezes gritam.

  Há graffitis que nos obrigam a parar. Estão em muros gastos, em prédios abandonados, em túneis esquecidos. Não passam despercebidos. São imagens que convocam o olhar. Ficam na retina. Às vezes emocionam. Outras vezes provocam. Quase sempre, têm mais a dizer do que painéis de exposições financiadas. São arte. E como qualquer arte, não pedem licença. Impõem-se.   Depois há os outros. Os das letras gordas. Ilegíveis. Feitas à pressa e por cima de tudo o que já lá (...)
06.08.25

Os olhos também gravam,

concerto de telemóvel na mão.

  Foi-se o tempo em que os concertos começavam com o barulho de vozes a afinar entusiasmo e terminavam com o som do encore a ecoar no peito. Agora, começam com ecrãs acesos e terminam com vídeos tremidos, de som saturado, a ocupar espaço na galeria do telemóvel e nenhum na memória.   Não é só uma questão de registar o momento. É uma compulsão de provar que se esteve lá. É o reflexo de uma plateia mais interessada em documentar do que em sentir. Gente a ver o concerto (...)
30.07.25

Reduzir o consumo,

somos curadores do inútil.

  Chegámos a um ponto em que já não compramos por necessidade. Nem sequer por desejo. Compramos por reflexo. É automático. A nova colecção adiciona-se ao carrinho. O último modelo vai para o bolso. A campanha do dia impossível resistir. E assim, sem pensar, acumulamos.   Temos três variações da mesma t-shirt. A branca, a cinzenta e a preta. Não há diferença entre elas. Nenhuma que mereça menção. Mas a repetição tranquiliza. Deixa-nos com a sensação de que estamos (...)
29.07.25

Viver com horário de executivo e alma de poeta.

  Há quem acorde com um despertador e quem acorde com um verso. O problema é quando se é os dois. Quando se tem de cumprir reuniões às nove, enviar o relatório às onze, alinhar com a equipa às quatro. E a cabeça pede tempo. Para escrever. Quando se sonha por dentro e se finge eficiência por fora.   Viver com horário de executivo e alma de poetaé viver em contradição. Acordamos cedo para trabalhar, mas o melhor pensamento chega às dez da noite, quando já ninguém nos (...)