Os sons da minha praia
a tradição ainda é o que era
A tradição ainda é o que era, pelo menos na minha praia. Mesmo sem Verão à vista.
Uns falam dos cheiros. Eu vou falar eterna e infinitamente mais vezes dos sons. Os sons da minha praia. Que, ano após ano, nunca mudam, nunca me deixam ficar mal.
As ondas a rebentar na areia.
O banheiro a apitar de forma histérica para aqueles que insistem em sair da zona de banhos.
As gargalhadas das gaivotas, quando vêm peixe no mar. Ou sardinhas assadas em terra.
Os berros da miudagem com a água fria a partir da cintura.
As raquetes de praia, num toc-toc constante. E os chutos descalços, numa bola cheia de areia.
Os aspiradores e as vassouras, numa luta incessante contra a areia dentro de casa.
As mães a chamarem os filhos. E os filhos as mães.
O spray do protetor solar. Ou a refilice de ter de o pôr.
A pá a cavar na areia molhada e o balde a virar, na tentativa de apresentar um molde perfeito.
O chapéu de sol a espetar bem fundo. E a toalha a ser sacudida.
Mas não é tudo. Porque na minha praia, a tradição ainda é mesmo o que era.
O homem das bolas de berlinde grita. E o dos gelados continua a dizer: Olhó Olá fresquinho. É frutóoooooooooo chocolate.
E o banheiro continua a apitar e a apitar. E os miúdos continuam a chorar por causa do peixe - aranha.
São as páginas da revista da avó. A luta entre o vento e o jornal do avô.
Os telemóveis a tocar! Os berros por causa da falta de rede. A tentativa de manter os cães presos, calados. O desassossego do sossego.
Na minha praia, os sons são mais fortes do que os cheiros.
E o melhor é que quando ponho o búzio encostado ao ouvido, consigo mesmo ouvi-los durante o ano inteiro.
❤️